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Mensagem por qiu Qua 28 Jul 2010, 10:53 am

pequenos contos ...grandes histórias em poucas palavras .....
apresentar textos nossos.....eu sei lá..........
poemas ..........pensamentos ..........
palavra soltas ...........
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Mensagem por qiu Qua 28 Jul 2010, 10:54 am

vou começar por este que me diz muito (espero que gostem)
Os olhos do abutre
Alexandre C. Leite

A Edgar Allan Poe


Andava à tarde pela Av. Rio Branco quando intuiu que alguém o seguia. Subitamente, girou a cabeça para trás pressentindo que segurariam seu braço. Não havia ninguém, além das centenas de rostos desconhecidos que formam o monstro disforme e imprevisível que chamamos de multidão.

Continuou caminhando, apressou o passo. Sentia-se zonzo, seus sapatos pisavam sobre uma calçada inconsistente, o concreto nunca antes lhe aparentou ser tão abstrato.

Convencia-se de que não precisava se preocupar, muito tempo se passara desde que executou a tarefa que lhe cabia. O destino é uma força que se cumpre, mesmo que a fragilidade do arrependimento venha depois, assim ele pensava...

A primeira vez que viu Rose, naquele sobrado da Rua do Acre, todos os seus sentidos foram tomados por uma paralisia angustiante. O universo congelou quando ela se aproximou e encostou o corpo quase desnudo ao seu. Ela tocou-lhe o rosto e perguntou o porquê dele estar sozinho e com aparência triste num canto do salão. Ele ficou mudo, não conseguiu emitir nem sequer um som; ela sorriu, encarou seus olhos profundamente, deu-lhe um beijo leve nos lábios e se afastou.

Uma mulher havia lido sua alma, uma meretriz da Praça Mauá o havia decifrado, ele sentia um misto de nojo e surpresa. A lembrança de Rose era a obsessão dos seus dias, não podia mais pensar em nada que não rodasse em torno da daquela imagem feminina que lhe surgiu tão intrigante.

Ele continuava andando, tinha certeza que alguém o seguia...

Como poderiam ter descoberto o que fez? Tudo saiu como planejara, tudo perfeito!

Olhava em volta, na tentativa de identificar seu perseguidor naquele turbilhão de faces e olhos. Nada! Inútil! Seus passos ficaram mais largos, a respiração mais ofegante e as recordações continuavam a brotar em cascata.

Depois da primeira vez em que a viu naquele prostíbulo, retornou em muitas outras noites para sentir-se próximo a ela. Nunca a tocou, ficava observando seus gestos, tentava ouvir sua voz em meio ao barulho da música ensurdecedora, torturava-se ao vê-la em beijos promíscuos com outros homens. Ela conhecia o seu segredo, ela o invadira.

Não se lembrava mais do momento em que decidiu fazer o que fez, talvez tenha sido na terceira visita àquele bordel, quando esbarrou novamente com os olhos de Rose o analisando, provocando-o a revelar-se. Rose tinha olhar de abutre, penetrava em suas entranhas e ele passou a sentir uma náusea insuportável, tinha ojeriza à sua presença, aversão à sua existência. Sim! Foi quando identificou aquele olhar de rapina que decidiu executar sua trama amoral.

Seu coração batia tão forte que podia escutá-lo, sua cabeça estalava em pulsações desordenadas. Por que o estavam seguindo? Como poderiam tê-lo encontrado? Ele pensou em parar e enfrentar quem o seguia, mas apressou o movimento das pernas, correu, queria escapar...

Antes da execução, dissecou detalhadamente a rotina de Rose, conheceu seu horário de entrada e saída no bordel do Centro da Cidade. Soube que ela saía sozinha e onde pegava a condução que a levava de volta para casa. Certo dia, seguiu a van que a transportava e descobriu que ela morava para os lados da Pavuna.

Agora, ele poderia traçar o roteiro do seu intento.

O fôlego começava a lhe faltar, mas as pernas respondiam numa corrida sem rumo no meio daquela selva de rostos anônimos, ele sentia a massa humana se contrair num espasmo voluntário. Queriam esmagá-lo. Ele estava acuado. Seu perseguidor não iria desistir.

O plano era simples e a técnica que usaria para eliminar a causadora do seu tormento se baseava numa leitura que havia feito há anos, num livro sobre medicina de guerra. Soldados usavam duas facas para apunhalar o inimigo na altura dos rins, simultaneamente. A dor era tão lancinante que a vítima não encontrava força para gritar. Seria assim!...

Quando Rose lançou-se pela Rua do Acre deserta e sombria, ele a chamou. Disse que havia atropelado um cachorro, pediu que ela o ajudasse a acomodar o animal no carro, que ele iria socorrê-lo. Ela se aproximou, curvou-se para tentar enxergar o cão ferido e ele então fincou, com violência e sincronia, os dois punhais nos rins da mulher.

Não houve grito, mas um grunhido abafado e terrível ascendeu do asfalto, o corpo de Rose petrificou-se. Ele a lançou no banco de trás da caminhonete e engrenou o carro pelo percurso que levava até a Pavuna.

Havia muito sangue, mas ele cobrira os bancos com lençóis e toalhas. No meio do caminho, numa rua deserta e escura do subúrbio, enrolou o corpo nos panos e o descarregou no meio-fio. Os olhos de Rose tinham a expressão do vácuo, o abutre estava morto. Ninguém mais conhecia o seu segredo. Tudo era silêncio...

Suas pernas vacilavam... Desde o dia do assassinato passou a vagar pelo Centro, sabia que alguém passara a segui-lo. As batidas do seu coração oprimiam seus ouvidos, o cérebro queria explodir, não conseguia mais correr, alcançara seu limite. A multidão o envolvia num círculo fechado, seus perseguidores eram muitos, ele ainda tentou um último pique desesperado, mas tropeçou e se viu arremessado, como num salto, aguardando o impacto vertiginoso com o chão áspero. Ele se debateu e bradou a sua culpa enquanto despencava.

Acordou!...

Estava amarrado por correias a uma estreita cama de ferro, o ambiente era de penumbra, cortinas de plástico o contornavam, escutou passos em aproximação. Uma mulher vestida de branco surgiu diante dele, lia-se um nome bordado no jaleco que trajava: Sanatório Estadual.

Ela tocou seu rosto e olhou dentro dos seus olhos. Ele estremeceu e chorou, antes de adormecer novamente ao pico ácido de uma seringa.

Eram os olhos do abutre!...
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Mensagem por Estrelinha Qua 28 Jul 2010, 10:56 am

muito bem qiu.. ADOREI este cantinho..
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Mensagem por qiu Qua 28 Jul 2010, 11:04 am

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Mensagem por Estrelinha Qua 28 Jul 2010, 11:06 am

AMO-TE ASSIM



Amo-te assim

Sem enfeites nem disfarces

Ungida pela água.

Cabelo corrido pelos ombros,

Olhos brilhantes de alegria e volúpia

Toda amor mar e harmonia

Como se tivesses descido do céu

E uma nuvem fosse o longo véu

Que nos envolvesse eternamente
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Mensagem por qiu Qua 28 Jul 2010, 11:07 am

Um conto vazio
Anna Carolina Paegle

Pensava a mil por hora e por isso andava sempre cansada...

Achava ter a vida uma beleza exaustiva e alinhar os pensamentos dava-lhe muito trabalho.

Costumava costurá-los como uma colcha de retalhos, mas não suportava cobrir-se com ela.

Foi quando, em um dia estranhamente verde, um gato entrou por sua janela, e, ao puxar um fio, desfez toda a colcha que estava sobre a cômoda, emaranhou-se em linhas e desapareceu no horizonte.

E ela então, obtendo alguns instantes de pausa ao perder os pensamentos, encontrou-se em sua essência e sorriu sinceramente.
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Mensagem por Estrelinha Qua 28 Jul 2010, 11:08 am

COMO SOU FELIZ



Quando tenho a certeza

Que não és ilusão, nem sonho

É uma sensação tão emocionante

Um sentimento de amor tão profundo

Que trocaria todo o mundo

Para viver só contigo

Para ser só teu.
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Mensagem por qiu Qua 28 Jul 2010, 11:19 am

A Beleza de um Olhar!!!!!!

Um olhar é imediato.
É aquele que primeiro escolhe um tudo para cada um.

É tão belo que a um olhar entre muitas coisas, escolhe a mais doce e bela para você.

Um olhar chora,
Um olhar vibra de alegria,
Brilha nos mais belos acontecimentos, mas também se fecha ao se deparar com a tristeza, a dor.

Um dia meus olhos te viram e de ti nunca esqueceram!
E dentro da minha mente, do meu coração você ficou.
E de lá nunca mais saíu.

Por um olhar podemos ter a primeira impressão, boa ou ruim, mas quem julga é o nosso coração.
Ele nos leva aos caminhos mais diferentes possíveis, onde só você poderá escolher.

O olhar as vezes é traisoeiro, de tanta raiva pode até matar um outro simples olhar, com um sim ou um não.

A beleza existe no seu contorno, no seu interior e brilha intensamente.
No mar, no céu, na terra.

O olhar sobrevive a quase tudo.
Só morre se for na escuridão.
Dá certeza de que nunca vai se abrir, chorar, brilhar ou fazer alguém feliz. Somente assim meu olhar não brilhará.


(recebi este poema de alguém especial com estas palavras : "És tão alegre ......tão especial ......mas tens um olhar tão triste....") releituras  1001 Icon_rolleyes já não é a primeira pessoa a dizer o mesmo ........... releituras  1001 Fresse
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Mensagem por Estrelinha Qua 28 Jul 2010, 11:21 am

qiu escreveu:A Beleza de um Olhar!!!!!!

Um olhar é imediato.
É aquele que primeiro escolhe um tudo para cada um.

É tão belo que a um olhar entre muitas coisas, escolhe a mais doce e bela para você.

Um olhar chora,
Um olhar vibra de alegria,
Brilha nos mais belos acontecimentos, mas também se fecha ao se deparar com a tristeza, a dor.

Um dia meus olhos te viram e de ti nunca esqueceram!
E dentro da minha mente, do meu coração você ficou.
E de lá nunca mais saíu.

Por um olhar podemos ter a primeira impressão, boa ou ruim, mas quem julga é o nosso coração.
Ele nos leva aos caminhos mais diferentes possíveis, onde só você poderá escolher.

O olhar as vezes é traisoeiro, de tanta raiva pode até matar um outro simples olhar, com um sim ou um não.

A beleza existe no seu contorno, no seu interior e brilha intensamente.
No mar, no céu, na terra.

O olhar sobrevive a quase tudo.
Só morre se for na escuridão.
Dá certeza de que nunca vai se abrir, chorar, brilhar ou fazer alguém feliz. Somente assim meu olhar não brilhará.


(recebi este poema de alguém especial com estas palavras : "És tão alegre ......tão especial ......mas tens um olhar tão triste....") releituras  1001 Icon_rolleyes já não é a primeira pessoa a dizer o mesmo ........... releituras  1001 Fresse

esta super lindo..humm
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Mensagem por qiu Qua 28 Jul 2010, 11:22 am

lindo mesmo releituras  1001 Herz
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Mensagem por Estrelinha Qua 28 Jul 2010, 11:24 am

É talvez o último dia da minha vida.


É talvez o último dia da minha vida.
Saudei o Sol, levantando a mão direita,
Mas não o saudei, dizendo-lhe adeus,
Fiz sinal de gostar de o ver antes: mais nada.

Alberto Caeiro

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Mensagem por Ti4go Qua 28 Jul 2010, 4:07 pm

Estrelinha escreveu:É talvez o último dia da minha vida.


É talvez o último dia da minha vida.
Saudei o Sol, levantando a mão direita,
Mas não o saudei, dizendo-lhe adeus,
Fiz sinal de gostar de o ver antes: mais nada.

Alberto Caeiro


Este senhor assusta-me bem como o resto da "família" dele Laughing
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Mensagem por Estrelinha Qua 28 Jul 2010, 4:12 pm

Ti4go escreveu:
Estrelinha escreveu:É talvez o último dia da minha vida.


É talvez o último dia da minha vida.
Saudei o Sol, levantando a mão direita,
Mas não o saudei, dizendo-lhe adeus,
Fiz sinal de gostar de o ver antes: mais nada.

Alberto Caeiro


Este senhor assusta-me bem como o resto da "família" dele Laughing

porque???
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Mensagem por Estrelinha Qua 28 Jul 2010, 4:19 pm

Mar Português

Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!

Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma nao é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.

Fernando Pessoa, in Mensagem


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Mensagem por ChøcøLåtë Qua 28 Jul 2010, 4:36 pm

qiu escreveu:vou começar por este que me diz muito (espero que gostem)
Os olhos do abutre
Alexandre C. Leite

A Edgar Allan Poe


Andava à tarde pela Av. Rio Branco quando intuiu que alguém o seguia. Subitamente, girou a cabeça para trás pressentindo que segurariam seu braço. Não havia ninguém, além das centenas de rostos desconhecidos que formam o monstro disforme e imprevisível que chamamos de multidão.

Continuou caminhando, apressou o passo. Sentia-se zonzo, seus sapatos pisavam sobre uma calçada inconsistente, o concreto nunca antes lhe aparentou ser tão abstrato.

Convencia-se de que não precisava se preocupar, muito tempo se passara desde que executou a tarefa que lhe cabia. O destino é uma força que se cumpre, mesmo que a fragilidade do arrependimento venha depois, assim ele pensava...

A primeira vez que viu Rose, naquele sobrado da Rua do Acre, todos os seus sentidos foram tomados por uma paralisia angustiante. O universo congelou quando ela se aproximou e encostou o corpo quase desnudo ao seu. Ela tocou-lhe o rosto e perguntou o porquê dele estar sozinho e com aparência triste num canto do salão. Ele ficou mudo, não conseguiu emitir nem sequer um som; ela sorriu, encarou seus olhos profundamente, deu-lhe um beijo leve nos lábios e se afastou.

Uma mulher havia lido sua alma, uma meretriz da Praça Mauá o havia decifrado, ele sentia um misto de nojo e surpresa. A lembrança de Rose era a obsessão dos seus dias, não podia mais pensar em nada que não rodasse em torno da daquela imagem feminina que lhe surgiu tão intrigante.

Ele continuava andando, tinha certeza que alguém o seguia...

Como poderiam ter descoberto o que fez? Tudo saiu como planejara, tudo perfeito!

Olhava em volta, na tentativa de identificar seu perseguidor naquele turbilhão de faces e olhos. Nada! Inútil! Seus passos ficaram mais largos, a respiração mais ofegante e as recordações continuavam a brotar em cascata.

Depois da primeira vez em que a viu naquele prostíbulo, retornou em muitas outras noites para sentir-se próximo a ela. Nunca a tocou, ficava observando seus gestos, tentava ouvir sua voz em meio ao barulho da música ensurdecedora, torturava-se ao vê-la em beijos promíscuos com outros homens. Ela conhecia o seu segredo, ela o invadira.

Não se lembrava mais do momento em que decidiu fazer o que fez, talvez tenha sido na terceira visita àquele bordel, quando esbarrou novamente com os olhos de Rose o analisando, provocando-o a revelar-se. Rose tinha olhar de abutre, penetrava em suas entranhas e ele passou a sentir uma náusea insuportável, tinha ojeriza à sua presença, aversão à sua existência. Sim! Foi quando identificou aquele olhar de rapina que decidiu executar sua trama amoral.

Seu coração batia tão forte que podia escutá-lo, sua cabeça estalava em pulsações desordenadas. Por que o estavam seguindo? Como poderiam tê-lo encontrado? Ele pensou em parar e enfrentar quem o seguia, mas apressou o movimento das pernas, correu, queria escapar...

Antes da execução, dissecou detalhadamente a rotina de Rose, conheceu seu horário de entrada e saída no bordel do Centro da Cidade. Soube que ela saía sozinha e onde pegava a condução que a levava de volta para casa. Certo dia, seguiu a van que a transportava e descobriu que ela morava para os lados da Pavuna.

Agora, ele poderia traçar o roteiro do seu intento.

O fôlego começava a lhe faltar, mas as pernas respondiam numa corrida sem rumo no meio daquela selva de rostos anônimos, ele sentia a massa humana se contrair num espasmo voluntário. Queriam esmagá-lo. Ele estava acuado. Seu perseguidor não iria desistir.

O plano era simples e a técnica que usaria para eliminar a causadora do seu tormento se baseava numa leitura que havia feito há anos, num livro sobre medicina de guerra. Soldados usavam duas facas para apunhalar o inimigo na altura dos rins, simultaneamente. A dor era tão lancinante que a vítima não encontrava força para gritar. Seria assim!...

Quando Rose lançou-se pela Rua do Acre deserta e sombria, ele a chamou. Disse que havia atropelado um cachorro, pediu que ela o ajudasse a acomodar o animal no carro, que ele iria socorrê-lo. Ela se aproximou, curvou-se para tentar enxergar o cão ferido e ele então fincou, com violência e sincronia, os dois punhais nos rins da mulher.

Não houve grito, mas um grunhido abafado e terrível ascendeu do asfalto, o corpo de Rose petrificou-se. Ele a lançou no banco de trás da caminhonete e engrenou o carro pelo percurso que levava até a Pavuna.

Havia muito sangue, mas ele cobrira os bancos com lençóis e toalhas. No meio do caminho, numa rua deserta e escura do subúrbio, enrolou o corpo nos panos e o descarregou no meio-fio. Os olhos de Rose tinham a expressão do vácuo, o abutre estava morto. Ninguém mais conhecia o seu segredo. Tudo era silêncio...

Suas pernas vacilavam... Desde o dia do assassinato passou a vagar pelo Centro, sabia que alguém passara a segui-lo. As batidas do seu coração oprimiam seus ouvidos, o cérebro queria explodir, não conseguia mais correr, alcançara seu limite. A multidão o envolvia num círculo fechado, seus perseguidores eram muitos, ele ainda tentou um último pique desesperado, mas tropeçou e se viu arremessado, como num salto, aguardando o impacto vertiginoso com o chão áspero. Ele se debateu e bradou a sua culpa enquanto despencava.

Acordou!...

Estava amarrado por correias a uma estreita cama de ferro, o ambiente era de penumbra, cortinas de plástico o contornavam, escutou passos em aproximação. Uma mulher vestida de branco surgiu diante dele, lia-se um nome bordado no jaleco que trajava: Sanatório Estadual.

Ela tocou seu rosto e olhou dentro dos seus olhos. Ele estremeceu e chorou, antes de adormecer novamente ao pico ácido de uma seringa.

Eram os olhos do abutre!...

Edgar Allan Poe...o mestre dos contos de terror Razz

Boa escolha. Também gosto de ler contos dele Smile
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Mensagem por Estrelinha Qua 28 Jul 2010, 5:21 pm

Liberdade

Ai que prazer
Não cumprir um dever,
Ter um livro para ler
E não o fazer!
Ler é maçada,
Estudar é nada.
O sol doira
Sem literatura.

O rio corre, bem ou mal,
Sem edição original.
E a brisa, essa,
De tão naturalmente matinal,
Como tem tempo não tem pressa...

Livros são papéis pintados com tinta.
Estudar é uma coisa em que está indistinta
A distinção entre nada e coisa nenhuma.

Quanto é melhor, quando há bruma,
Esperar por D. Sebastião,
Quer venha ou não!

Grande é a poesia, a bondade e as danças...
Mas o melhor do mundo são as crianças,
Flores, música, o luar, e o sol, que peca
Só quando, em vez de criar, seca.

O mais do que isto
É Jesus Cristo,
Que não sabia nada de finanças
Nem consta que tivesse biblioteca...


Fernando Pessoa

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Mensagem por qiu Qui 29 Jul 2010, 8:34 am

ChøcøLåtë escreveu:
qiu escreveu:vou começar por este que me diz muito (espero que gostem)
Os olhos do abutre
Alexandre C. Leite

A Edgar Allan Poe


Andava à tarde pela Av. Rio Branco quando intuiu que alguém o seguia. Subitamente, girou a cabeça para trás pressentindo que segurariam seu braço. Não havia ninguém, além das centenas de rostos desconhecidos que formam o monstro disforme e imprevisível que chamamos de multidão.

Continuou caminhando, apressou o passo. Sentia-se zonzo, seus sapatos pisavam sobre uma calçada inconsistente, o concreto nunca antes lhe aparentou ser tão abstrato.

Convencia-se de que não precisava se preocupar, muito tempo se passara desde que executou a tarefa que lhe cabia. O destino é uma força que se cumpre, mesmo que a fragilidade do arrependimento venha depois, assim ele pensava...

A primeira vez que viu Rose, naquele sobrado da Rua do Acre, todos os seus sentidos foram tomados por uma paralisia angustiante. O universo congelou quando ela se aproximou e encostou o corpo quase desnudo ao seu. Ela tocou-lhe o rosto e perguntou o porquê dele estar sozinho e com aparência triste num canto do salão. Ele ficou mudo, não conseguiu emitir nem sequer um som; ela sorriu, encarou seus olhos profundamente, deu-lhe um beijo leve nos lábios e se afastou.

Uma mulher havia lido sua alma, uma meretriz da Praça Mauá o havia decifrado, ele sentia um misto de nojo e surpresa. A lembrança de Rose era a obsessão dos seus dias, não podia mais pensar em nada que não rodasse em torno da daquela imagem feminina que lhe surgiu tão intrigante.

Ele continuava andando, tinha certeza que alguém o seguia...

Como poderiam ter descoberto o que fez? Tudo saiu como planejara, tudo perfeito!

Olhava em volta, na tentativa de identificar seu perseguidor naquele turbilhão de faces e olhos. Nada! Inútil! Seus passos ficaram mais largos, a respiração mais ofegante e as recordações continuavam a brotar em cascata.

Depois da primeira vez em que a viu naquele prostíbulo, retornou em muitas outras noites para sentir-se próximo a ela. Nunca a tocou, ficava observando seus gestos, tentava ouvir sua voz em meio ao barulho da música ensurdecedora, torturava-se ao vê-la em beijos promíscuos com outros homens. Ela conhecia o seu segredo, ela o invadira.

Não se lembrava mais do momento em que decidiu fazer o que fez, talvez tenha sido na terceira visita àquele bordel, quando esbarrou novamente com os olhos de Rose o analisando, provocando-o a revelar-se. Rose tinha olhar de abutre, penetrava em suas entranhas e ele passou a sentir uma náusea insuportável, tinha ojeriza à sua presença, aversão à sua existência. Sim! Foi quando identificou aquele olhar de rapina que decidiu executar sua trama amoral.

Seu coração batia tão forte que podia escutá-lo, sua cabeça estalava em pulsações desordenadas. Por que o estavam seguindo? Como poderiam tê-lo encontrado? Ele pensou em parar e enfrentar quem o seguia, mas apressou o movimento das pernas, correu, queria escapar...

Antes da execução, dissecou detalhadamente a rotina de Rose, conheceu seu horário de entrada e saída no bordel do Centro da Cidade. Soube que ela saía sozinha e onde pegava a condução que a levava de volta para casa. Certo dia, seguiu a van que a transportava e descobriu que ela morava para os lados da Pavuna.

Agora, ele poderia traçar o roteiro do seu intento.

O fôlego começava a lhe faltar, mas as pernas respondiam numa corrida sem rumo no meio daquela selva de rostos anônimos, ele sentia a massa humana se contrair num espasmo voluntário. Queriam esmagá-lo. Ele estava acuado. Seu perseguidor não iria desistir.

O plano era simples e a técnica que usaria para eliminar a causadora do seu tormento se baseava numa leitura que havia feito há anos, num livro sobre medicina de guerra. Soldados usavam duas facas para apunhalar o inimigo na altura dos rins, simultaneamente. A dor era tão lancinante que a vítima não encontrava força para gritar. Seria assim!...

Quando Rose lançou-se pela Rua do Acre deserta e sombria, ele a chamou. Disse que havia atropelado um cachorro, pediu que ela o ajudasse a acomodar o animal no carro, que ele iria socorrê-lo. Ela se aproximou, curvou-se para tentar enxergar o cão ferido e ele então fincou, com violência e sincronia, os dois punhais nos rins da mulher.

Não houve grito, mas um grunhido abafado e terrível ascendeu do asfalto, o corpo de Rose petrificou-se. Ele a lançou no banco de trás da caminhonete e engrenou o carro pelo percurso que levava até a Pavuna.

Havia muito sangue, mas ele cobrira os bancos com lençóis e toalhas. No meio do caminho, numa rua deserta e escura do subúrbio, enrolou o corpo nos panos e o descarregou no meio-fio. Os olhos de Rose tinham a expressão do vácuo, o abutre estava morto. Ninguém mais conhecia o seu segredo. Tudo era silêncio...

Suas pernas vacilavam... Desde o dia do assassinato passou a vagar pelo Centro, sabia que alguém passara a segui-lo. As batidas do seu coração oprimiam seus ouvidos, o cérebro queria explodir, não conseguia mais correr, alcançara seu limite. A multidão o envolvia num círculo fechado, seus perseguidores eram muitos, ele ainda tentou um último pique desesperado, mas tropeçou e se viu arremessado, como num salto, aguardando o impacto vertiginoso com o chão áspero. Ele se debateu e bradou a sua culpa enquanto despencava.

Acordou!...

Estava amarrado por correias a uma estreita cama de ferro, o ambiente era de penumbra, cortinas de plástico o contornavam, escutou passos em aproximação. Uma mulher vestida de branco surgiu diante dele, lia-se um nome bordado no jaleco que trajava: Sanatório Estadual.

Ela tocou seu rosto e olhou dentro dos seus olhos. Ele estremeceu e chorou, antes de adormecer novamente ao pico ácido de uma seringa.

Eram os olhos do abutre!...


Edgar Allan Poe...o mestre dos contos de terror releituras  1001 Icon_razz

Boa escolha. Também gosto de ler contos dele releituras  1001 Icon_smile
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Mensagem por qiu Qui 29 Jul 2010, 8:35 am

CORAÇÃO DENUNCIADOR

de Edgar Alan Poe



É verdade tenho sido nervoso, muito nervoso, terrivelmente nervoso! Mas por que ireis dizer que sou louco? A enfermidade me aguçou os sentidos, não os destruiu, não os entorpeceu. Era penetrante, acima de tudo, o sentido da audição. Eu ouvia todas as coisas, no céu e na terra. Muitas coisas do inferno eu ouvia. Como, então, sou louco? Prestai atenção! E observai quão lucidamente, quão calmamente posso contar toda a história.



É impossível dizer como a idéia me penetrou primeiro no cérebro, uma vez concebida, porém, ela perseguiu dia e noite. Não havia motivo. Não havia cólera. Eu gostava do velho. Ele nunca fizera mal. Nunca me insultara. Eu não desejava seu ouro. Penso que era o olhar dele! Sim, era isso! Um de seus olhos parecia com o de um abutre... um olho de cor azul pálida, que sofria de catarata . Meu sangue se enregelava sempre que ele caía sobre mim; e assim, pouco a pouco, bem lentamente , fui-me decidindo a tirar a vida do velho e assim libertar-me daquele olho para sempre.



Ora, aí é que estava o problema. Imaginais que sou louco. Os loucos nada sabem. Deveríeis, porém, ter-me visto. Deveríeis ter visto como procedi cautelosamente, com que prudência, com que previsão, com que dissimulação, lancei mão à obra!



Eu nunca fora mais bondoso para com o velho do que durante a semana inteira, antes de matá-lo. todas as noites, por volta da meia-noite, eu girava o trinco da porta de seu quarto e abria-a... oh! Bem devagarinho! E depois, quando a abertura era suficientemente para conter minha cabeça, eu introduzia uma lanterna com tampa, toda velada, bem velada, de modo que nenhuma luz se projetasse para fora, e em seguida enfiava a cabeça. Oh! Teríeis rido ao ver como enfiava habilmente! Movia-a lentamente, muito, muito lentamente, a fim de não perturbar o sono do velho. Levava uma hora para colocar a cabeça inteira além da abertura, até podê-lo ver deitado na cama. Ah! Um louco seria precavido assim? E depois, quando minha cabeça estava bem dentro do quarto, eu abria a tampa da lanterna cautelosamente... oh! Bem cautelosamente!... cautelosamente... por que a dobradiça rangia... abria-a só até permitir que apenas um débil raio de luz caísse no olho de abutre. E isto eu fiz durante sete longas noites... sempre precisamente à meia-noite... e sempre encontrei o olho fechado. Assim, era impossível fazer minha tarefa, porque não era o velho que me perturbava, mas seu olho diabólico. E todas as manhãs, sem temor, chamando-o pelo nome com ternura e perguntando como havia passado a noite. Por aí vedes que ele precisaria ser um velho muito perspicaz para suspeitar que todas as noites, justamente às doze horas, eu o espreitava, enquanto dormia.



Na oitava noite, fui mais cauteloso do que de hábito, ao abrir a porta. O ponteiro dos minutos de um relógio mover-se-ia mais rapidamente do que meus dedos. Jamais, antes daquela noite, sentira eu tanto a extensão de meus próprios poderes, de minha sagacidade. Mal conseguia conter meus sentimentos de triunfo. Pensar que ali estava eu, a abrir a porta, pouco a pouco, e que ele nem sequer sonhava com meus atos ou pensamentos secretos... Ri com gosto, entre dentes, e essa idéia; e talvez ele me tivesse ouvido, porque se moveu de súbito na cama, como se assustado. Pensava talvez que recuei? Não! O quarto dele estava escuro como piche, espesso de sombra, pois os postigos se achavam hermeticamente fechado, por medo aos ladrões. E eu sabia, assim, que ele não podia ver a abertura da porta; continuei a avançar, cada vez mais, cada vez mais.



Já estava com a cabeça dentro do quarto e a ponto de abrir a lanterna, quando meu polegar deslizou sobre o fecho da porta e o velho saltou na cama gritando: "Quem está aí?"

Fiquei completamente silencioso e nada disse. Durante uma hora inteira não movi um músculo e, por todo esse tempo, não o ouvi deitar-se de novo: ele ainda estava sentado na cama, à escura; justamente com eu fizera, noite após noite, ouvindo a ronda da morte próxima.



Depois, ouvi um leve gemido e notei que era um gemido de terror mortal. Não era um gemido de dor ou pesar, oh não! Era o som grave e sufocado. Bem conhecia esse som. Muitas noites, ao soar a meia-noite, quando o mundo inteiro dormia, ele irrompia de meu próprio peito, aguçando, com o seu eco espantoso, os terrores que me aturdiam. Disse que bem o conhecia. Conheci também o eu o velho sentia e tive pena dele, embora abafasse o riso no coração. Eu sabia que ele ficara acordado, desde o primeiro leve rumor, quando se voltar na cama. Daí por diante, seus temores foram crescendo. Tentara imaginá-los sem motivo mas não fora possível. Dissera a si mesmo; "É só o vento na chaminé", ou "é só um rato andando pelo chão", ou "foi apenas um grilo que cantou um instante só": sim, ele estivera tentando animar-se com essas suposições, mas tudo fora em vão. Tudo em vão, porque a Morte, ao aproximar-se dele, projetava sua sombra negra para frente, envolvendo nela a vítima. E era a influência tétrica dessa sombra não percebia que o levava a sentir - embora não visse, nem ouvisse - a sentir a presença de minha cabeça dentro do quarto.



Depois de esperar longo tempo, com muita paciência, sem ouvi-lo deitar-se, resolvi abrir um pouco, muito, muito pouco, a tampa da lanterna. Abri-a, podeis imaginar o quão furtivamente; até que, por fim, um raio de luz apenas, tênue como o fio de uma teia de aranha, passou pela fenda e caiu sobre o olho de abutre.



Ele estava aberto; todo, plenamente aberto. E, ao contemplá-lo, minha fúria cresceu. Vi-o, com perfeita clareza; todo de um azul desbotado, com uma horrível película a cobri-lo, o que me enregelava até a medula dos ossos. Mas não podia ver nada mais da face, ou do corpo do velho, pois dirigira a luz como por instinto, sobre o maldito lugar.



Ora, não vos disse que apenas é superacuidade dos sentidos aquilo que erradamente julgais loucura? Repito, pois, que chegou a meus ouvidos em som baixo, monótono, rápido, como o de um relógio, quando abafado com algodão. Igualmente eu bem sabia que som era. Era o bater do coração do velho. Ele me aumentava a fúria, como o bater um tambor estimula a coragem do soldado.



Ainda aí, porém, refreei-me e fiquei quieto. Tentei manter tão fixamente quanto pude a réstia de luz sobre o olho do velho. Entretanto, o infernal tam-tam do coração aumentava. A cada instante ficava mais alto, mais rápido! Cada vez mais alto, repito, a cada momento! Prestai-me bem atenção? Disse-vos que sou nervoso: sou. E então, àquela hora morta da noite, tão estranho ruído excitou em mim um terror incontrolável. Contudo, por alguns minutos mais, dominei-me e fiquei quieto. Mas o bater era cada vez mais alto. Julguei que o coração ia rebentar. E, depois, nova angústia me aferrou: o rumor poderia ser ouvido por um vizinho! A hora do velho tinha chegado! Com um alto berro, escancarei a lanterna e pulei para dentro do quarto. Ele guinchou mais uma vez... uma vez só. Num instante arrastei-o para o soalho e virei a pesada cama sobre ele. Então sorri alegremente por ver a façanha realizada. Mas, durante muitos minutos, o coração continuou a bater, com som surdo. Isto, porém, não me vexava. Não seria ouvido através da parede. Afinal cessou. O velho estava morto. Removi a cama e examinei o cadáver. Sim, era um pedra, uma pedra morta. Coloquei minha mão sobre o coração e ali a mantive durante muitos minutos. Não havia pulsação. Estava petrificado. Seu olho não me perturbaria.



Se ainda pensais que sou louco, não mais pensareis, quando eu descrever as sábias precauções que tomei para ocultar o cadáver. A noite avançava e eu trabalhava apressadamente, porém em silêncio. Em primeiro lugar, esquartejei o corpo. Cortei-lhe a cabeça, os braços e as pernas.



Arranquei depois três pranchas do soalho e coloquei tudo entre os vãos. Depois recoloquei as tábuas, com tamanha habilidade e perfeição, que nenhum olhar humano, nem mesmo o dele, poderia distinguir qualquer coisa suspeita. Nada havia a lavar, nem mancha de espécie alguma, nem marca de sangue. Fora demasiado prudente no evitá-las. Uma tina tinha recolhido tudo... ah! Ah! Ah! Terminadas todas essas tarefas, eram quatro horas. Mas ainda estava escuro, como se fosse meia-noite. Quando o sino soou a hora, bateram a porta da rua. Desci para abri-la, de coração ligeiro,... pois que tinha eu agora a temer? Entraram três homens que se apresentaram , com perfeita mansidão, com soldados de polícia. Fora ouvido um grito por um vizinho, durante a noite. Despertara-se a suspeita de um crime. Tinha-se formulado uma denúncia à polícia e eles, soldados , tinham sido mandados para investigar.

Sorri... pois que tinha eu a temer? Dei as boas vindas aos cavalheiros. O grito, disse eu, fora meu mesmo, em sonhos. O velho, relatei, estava ausente, no interior. Levei meus visitantes a percorrer toda a casa. Pedi que dessem busca... completa. Conduzi-os, afinal, ao quarto dele. Mostrei-lhe suas riquezas, em segurança inatas. No entusiasmo de minha confiança, trouxe cadeiras para o quarto e mostrei desejos de que eles ficassem ali, para descansar de suas fadigas, enquanto eu mesmo, na desenfreada audácia do meu perfeito triunfo, colocava minha própria cadeira , precisamente sobre o lugar onde repousava o cadáver da vítima.

Os soldados ficaram satisfeitos. Minhas maneiras os haviam convencido. Sentia-me singularmente à vontade. Sentaram-se e, enquanto eu respondia cordialmente, conversavam coisas familiares. Mas, dentro em pouco, senti que ia empalidecendo e desejei que eles se retirassem. Minha cabeça me doía e parecia-me ouvir zumbidos nos ouvidos; eles, porém, continuavam sentados e continuavam a conversar. O zumbido tornou-se mais distinto. Continuou e tornou-se ainda mais distinto: eu falava com mais desenfreio, para dominar a sensação: ela, porém, continuava a aumentava sua perceptibilidade, até que, afinal, descobri que o barulho não era dentro dos meus ouvidos.



É claro que então minha palidez aumentou sobreposse. Mas eu falava ainda mais fluentemente e num tom de voz muito elevada. Não obstante, o som se avolumava... E que podia fazer? Era um som grave, monótono, rápido... muito semelhante ao de um relógio envolto em algodão. Respirava com dificuldade... E no entanto, os soldados não o ouviram. Falei mais depressa ainda, com mais veemência. Mas o som aumentava constantemente. Levantei-me e fiz perguntas a respeito de ninharias, num tom bastante elevado, e com violenta gesticulação, mas o som constantemente aumentava. Por que não se iam embora? Andava pelo quarto acima e abaixo, com largas e pesadas passadas, como se excitado até a fúria pela vigilância dos homens... mas o som aumentava constante. Oh! Deus! Que poderia eu fazer? Espumei... enraiveci-me... praguejei! Fiz girar a cadeira, sobre a qual estivera sentado, e arrastei-a sobre as tábuas, mas o barulho se elevava acima de tudo e continuamente aumentava. Tornou-se então mais alto... mais alto... mais alto! E os homens continuavam ainda a passear, satisfeitos e sorriam. Seria possível que eles não ouvissem? Deus Todo Poderoso!... não, não! Eles suspeitavam!.. Eles sabiam!... Estavam zombando do meu horror!... Isto pensava eu e ainda penso. Outra coisa qualquer, porém, era melhor que essa agonia! Qualquer coisa era mais tolerável que essa irrisão! Não podia suportar por mais tempo aqueles sorrisos hipócritas! Sentia que devia gritar ou morrer!... E agora... de novo! Escutai! Mais alto! Mais alto! Mais alto! Mais alto! Mais alto...



Visões! - trovejei - Não finjam mais! Confesso o crime!... Arranquem as pranchas!.. aqui, aqui! ... ouçam o bater do seu horrendo coração!

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Mensagem por Estrelinha Qui 29 Jul 2010, 9:30 am

NO TEMPO QUE PASSA



No mar que navego

Na voz que oiço,

No corpo que possuo

No tempo que passa

Só tu, tens o saber da vida,

O sentido das emoções

O instintivo talento do amor,

O toque imprevisível

Que torna um prazer eterno.



Só tu, com os teus expressivos olhos

O sussurrar do coração entre os dedos

Conheces do amor os segredos

E assim fascinas, assim cativas.
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Mensagem por Estrelinha Qui 29 Jul 2010, 10:01 am

OS DIVINOS MOMENTOS



O cheiro do teu corpo

Provoca

A fúria da posse.



E quando te possuo,

No estertor

Desse inesquecível prazer,



Agradeço a Deus

Os divinos momentos

Em que unimos corpos

E sentimentos.



Finalmente, somos nós.
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Mensagem por Estrelinha Sex 30 Jul 2010, 12:07 am

SÓ PARA TI



Só para ti

Que amo mais que ao mundo

Posso dizer o que não devo.



Ter pensamentos que nunca pensei.

Dizer palavras que nunca conheci.



De tanto te amar, tenho medo

De viver

No terreno infinito das ilusões.
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Mensagem por Estrelinha Sex 30 Jul 2010, 12:07 am

ESTE DESEJO CONSTANTE

DE AMAR



Só contigo satisfaço

Este desejo constante de amar

Esta ansiedade.



É contigo que eu sinto

Rir de alegria o corpo

Numa saudação

Ao amor sobrenatural

Em que nos envolvemos.
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Mensagem por qiu Sex 30 Jul 2010, 8:36 am

Partem tão tristes...

Senhora, partem tão tristes
meus olhos por vós, meu bem,
que nunca tão tristes vistes
outros nenhuns por ninguém.

Tão tristes, tão saudosos,
tão doentes da partida,
tão cansados, tão chorosos,
da morte mais desejosos
cem mil vezes que da vida.
Partem tão tristes, os tristes,
tão fora de esperar bem
que nunca tão tristes vistes
outros nenhuns por ninguém


João Roiz de Castelo-Branco, Cancioneiro Geral
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Mensagem por qiu Sex 30 Jul 2010, 8:38 am

Este Inferno de Amar
Este Inferno de Amar
Este inferno de amar - como eu amo!-
Quem mo pôs n'alma... quem foi?
Esta chama que alenta e consome,
Que é a vida - e que a vida destrói-
Como é que se veio a atear,
Quando - ai quando se há de ela apagar?

Eu não sei, não me lembra: o passado,
A outra vida que dantes vivi
Era um sonho talvez... - foi um sonho -
Em que paz tão sera o dormi!
Oh! que doce era aquele sonhar...
Quem me veio, ai de mim! desperatar?

Só me lembra que um dia formoso
Eu passei... dava o Sol tanta luz!
E os meus olhos, que vagos giravam,
Em seus olhos ardentes os pus.
Que fez ela? eu que fiz? - Não no sei;
Mas nessa hora a viver comecei...

Almeida Garret
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Mensagem por qiu Sex 30 Jul 2010, 8:41 am

Seus Olhos
Seus olhos ... se eu sei pintar
O que os meus olhos cegou ...
Não tinham luz de brilhar.
Era chama de queimar;
E o fogo que a ateou
Vivaz, eterno, divino,
Como facho do Destino.


Divino, eterno! ... e suave
Ao mesmo tempo: mas grave
E de tão fatal poder,
Que, num só momento que a vi,
Queimar toda alma senti...
Nem ficou mais de meu ser,
Senão a cinza em que ardi.


Almeida Garrett
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